29.9.05

Díli entre as mais caras

Aqui fica a reprodução de um artigo que saiu na imprensa há cerca de um mês. É tudo muito caro. Díli vive fora da realidade, graças às organizações internacionais. Um dia, vai ter de voltar a pôr os pés na terra.... 20 dólares por uma refeição, 700 a 1.800 por um quarto de hotel, ao mês, quatro ou cinco por um vodka, dois por um iogurte, representa estar muito acima da maioria dos países da região a nível de custo de vida. Mas não da qualidade...

A capital de Timor-Leste, Díli, foi considerada a 8ª cidade mais cara da Ásia, à frente de Singapura e Pequim, de acordo com um estudo elaborado pela ECA International, uma empresa especializada em recursos humanos. A lista, que apresenta três cidades japonesas, Tóquio, Yokohama e Kobe, nos lugares cimeiros, cobre 39 cidades asiáticas e foi elaborada a partir de um cabaz composto por 125 bens variados, desde mercearias a aparelhos eléctricos, passando por roupas, serviços e refeições em restaurantes. Apresentada no passado dia 2, a listagem apresenta Macau como a 5ª cidade mais cara, atrás de Seul, e à frente de Hong Kong, Taipe, Díli, Singapura e Pequim. O surpreendente oitavo lugar de Díli, capital do país mais pobre do continente asiático e um dos mais pobres do planeta, é explicado pela ECA International como resultante do facto de os bens de consumo existentes serem todos importados para satisfazer a procura dos expatriados que residem no país. "Para quem pretende seguir um padrão internacional de consumo, o custo de vida em Díli é superior ao de Singapura", destacou Lee Quane, director-geral da ECA International. A capital do Bangladesh, Dhaka, é considerada a cidade com o custo de vida mais barato, seguindo-se Manila, Cidade de Ho Chi Min, Bangalore (Índia) e Islamabad. A capital indonésia, Jacarta, figura num modesto 15º lugar.

20.9.05

Cruzes desabitadas

A semana passada estive quase quatro dias sem electricidade no meu local de trabalho. On and off. O gerador estava avariado e a minha UPS não dura mais de meia hora. Assim, não é fácil actualizar um blog. É também impossível ver televisão fora de Díli, se bem que há quem tenha rádio. Mas, claro, quando as antenas da própria rádio não funcionam - porque o gerador que as alimenta está avariado - não é possível ouvir rádio. Também quase não há distribuição de jornais fora de Díli, os quais, de qualquer modo, só poderiam ser lidos depois do trabalho, à luz da vela.
Os indonésios instalaram extensas linhas de electricidade, o que se pode comprovar pelos milhares de postes desligados que se encontram ao longo até de estradas mais remotas. Mas com a política de terra queimada tudo foi destruído e alguém se encarregou de retirar os fios de cobre - valiosos - e de os vender a um sucateiro australiano.
Restam os postes, quais cruzes desabitadas.

16.9.05

Raça





Perto da vila de Raça, no Planalto de Tchaiquéri. As mulheres dos Fataluku são as mais belas de Timor, dizem. Eis um exelente exemplo. Chegam a valer 250 karaus (búfalos). Os Fatalukos falam a sua língua e usaram sem dificuldade a dos portugueses e mesmo a dos indonésios. Tétum, é que nem pensar.
A questão da(s) língua(s) em Timor-Leste é complicada...

A festa da morte

Porque estava no Atauro, falhei o funeral do padre Francisco Fernandes, transladado de Macau.
Lá, soube da doença e aqui da morte. Nesse dia, de manhã cedo, telefona-me o João – timorense que viveu na Austrália: «Temos festa!». «Ai sim?», bocejei. «Morreu o padre Chico.» «Hem?» «Vai haver funeral», explicou. Quando acordei definitivamente pensei que tinha sido uma piada honírica de mau gosto. Mas não. Descobri, entretanto, que os funerais são de extrema importância social em Timor, as grandes reuniões de família, o evento para se frequentar. Não vais, tás fora. E eu que perdi o do padre Chico, que ainda por cima era um tipo com humor que gostava de festa, como qualquer bom timorense.

Sexo

Remédio aconselhado por alguns médicos às professoras portuguesas, vindas das berças e em depressão: uma maior dedicação às práticas sexuais… Os púdicos dizem que as raparigas levaram o conselho demasiado a sério… O ano lectivo começou agora. Veremos se a prescrição ainda está no prazo.

«Quando começares a olhar para as timoreneses é porque estás cá há demasiado tempo» –dizem alguns machos tuga.

«Há muita solidão aqui... mas evita os portugueses: para além de serem tacanhos e bigodudos, são uns fala barato», dizem elas, as tugas.

Amizades

«Ah, já conheces o X? Sou muito amigo dele. É um gajo porreiro. Quando bebe um bocado é que fica chato, sempre a repetir-se» – diz o Y. Entretanto conhecemos o H. «O Y? É pá, é um grande amigo! Não encontras melhor. Só é aborrecido quando bebe, está sempre a contar a mesma história, já não o aguentas.» E por aí a fora...
Note-se que em Timor os malays (estrangeiros)bebem muito...

12.9.05

Miúdos

Num país onde a média de partos por mulher é de 7.4 grande parte das pessoas que se encontram pela estrada são crianças. Eis algumas:


Em Díli, uma miúda assiste a um jogo de futebol feminino. Na cidade, as crianças sorriem menos. As meninas, sobretudo, não têm a vida facilitada. A violência doméstica e a violência fisíca em geral, incluindo a violação sexual, é comum na família e na escola.



Vila antes de Com. Vieram todos ver os malay. Encontrei vários albinos, por estes lados.


De pequenino se torce o pepino. Macho que é macho, esfumaça...


Em Jaco. No castelo de areia brilham os restos de recipientes de plástico, raridade...

Depois de Fuiloro. A mão de obra infantil é fundamental para a sobrevivência da família.


Na Pousada de Tutuala os miúdos tentam vender bugigangas feitas de carapaça de tartaruga. Pouco ecológico, mas eles nem imaginam o que isso seja...

9.9.05

O país crocodilo



Em Com, na praia, à beira do hotel.
Não há crocodilos na costa norte, dizem. Raramente aparecem…

Mas há alguns anos apareceu um crocodilo na Areia Branca, Díli. Instruções: «Quando o virem para lá do coral, nadem. Quando o virem mergulhar, saiam da àgua». A coisa resultou durante uns tempos. Os polícias portugueses queriam dar-lhe um tiro, mas os timorenses diziam que nem pensar, era o avô deles, até que os militares australianos, mais experientes nestas coisas de crocodilos de água salgada, foram capturar o bicho. E afinal não era só um, mas três….

O crocodilo é um animal sagrado para os timorenses. A ilha de Timor tem, supostamente, a forma de um crocodilo. «E a montanha X e a montanha Y e a rocha e tudo e mais alguma coisa – os timorenses estão sempre a ver crocodilos», diz um amigo.
Também os começo a ver…

7.9.05

Pela Estrada 2



Campas no Planalto de Tchaiquéri. Cruzes e cornos. Tal como noutros países católicos a religião e o animismo cruzam-se.



De Tutuala para a praia de Valu a estrada mais parece o leito de um rio. Mas, com boa vontade, chega-se a todo o lado, em Timor. Ao fundo, a ilha de Jaco, o estremo este do país. Aí, vi uma corça na praia, hipnotizada pela àgua do mar, enquanto um pescador corria para ela de catana na mão. A caça falhou. Os veados vêm à praia beber a àgua do mar porque as poças secam nesta estação.



As casas de Los Palos ou as casas dos povo Fataluku são bem conhecidas como símbolo nacional, mas não restam muitas originais.




O Forte de Fuiloro, tal como o de Maubara, não passa de um arco arruinado. Mas lá dentro não encontrei morador,nem cão, apenas uma cruz a marcar uma morte naquele local.



A caminho de Lautem. Há arvores que gostam de água salgada. Como os «lafaek», os crocodilos.



Aqui, perto da Lagoa de Tacitolo o papa dirigiu-se aos timorenses ainda durante a época da dominação indonésia e aqui vai ser construída uma estátua ao falecido. Cerca de 98 por cento da população é católica. O sempre sábio Lonely Planet diz que é só 90 por cento e que os timorenses só se tornaram realmente católicos durante essa época. Antes de 75, o catolicismo fazia parte da estrutura do estado português e os timorenses não queriam saber do assunto na sua vida do dia a dia. Mas, como os indonésios obrigaram a população a declarar a sua filiação religiosa - para saber quais eram os ateus e portanto os comunistas - todos se declararam católicos para não serem perseguidos. E pronto, é só por isso que os timorenses são católicos. O «Lonely Planet» lá sabe (sabem que «lá» quer dizer «não» em tétum?).

5.9.05

Pela Estrada 1

Muito tenho viajado por este Timor... aqui ficam umas primeiras impressões visuais.




Diz o Lonely Planet esse guia fundamental do viajante, sempre muito anticolonialista, (mas só quando os colonos não são anglo-saxónicos, claro) que os portugueses nunca cá construíram sequer uma ponte. É mentira, porque havia algumas, mas na realidade, em 1975, Portugal também não não tinha muitas pontes recentes de que se orgulhar, para além da Salazar.




A Pousada de Baucau, reconstruída, chama turistas e «internacionais» (os estrangeiros, ou malays, que trabalham para instituições internacionais, ONGs, ONUs e afins). Eu tive a sorte de ficar em casa de um amigo...



Do Forte de Maubara, do século XVII, restam os canhões. Lá dentro, numa casa recém construída moram um macaco, o dono e o cão, que não entende que o património cultural é de todos e me tentou ferrar.



Na Lagoa de Maubara nadam os pelicanos, que ao contrários dos timorenses, não gostam de ser fotografados.



A Baía de Tibar - ostras e ameijoas à venda na estrada.



O «Carlos» em Díli, com o Jesus ao fundo. Antro de portugueses.... e primeiro local onde fui levada assim que cheguei.

1.9.05

Macau: a ponte para o jogo


Antes de chegar a Díli passei por Macau: porto obrigatório para qualquer alma lusa que ande pelo sudeste asiático. Ainda mais para quem lá habitou quase uma década.
Chovia porque havia uma série de tufões a formar-se no mar do Japão, o que não alterou em nada o encanto da terra, pelo contrário. «Home is where the heart is», e o meu está lá.


As Portas do Entendimento, outrora um dos marcos mais visíveis do território, foram entretanto «engolidas» pela nova ponte sobre o Rio das Pérolas e pela construção desmesurada de casinos.


Logo à chegada do jetfoil, o casino americano Sands - de que cuja arquitetura os chineses não gostam porque é demasiado simples, não tem cores e luzes - ensombra um género de cidade dos pequeninos, com casinhas holandesas, reproduções de casas portuguesas de Macau e outras de origem por determinar. Um vulcão - dos pequeninos - completa o conjunto ainda por inaugurar.

Há três anos achei Macau uma cidade bonita, acabado o periodo de estaleiro que tantos anos durou. Voltada para o rio, com um equilibrio entre a nova arquitetura e os edifícios históricos (e uns acidentes de percurso mais ou menos disfarçados). Agora, Macau perde o equilíbrio e transforma-se numa grande Feira Popular do jogo e afins.